domingo, 13 de janeiro de 2008

Em céu de brigadeiro, rimos até de piadas sem graça

Tudo indica que mais uma bolha estourou no mercado financeiro nas últimas semanas. Após seis anos do estouro da bolha das chamadas empresas ponto-com, agora foi a vez de um forte ajuste nos preços dos principais ativos globais decorrente do pânico causado pela crise do mercado norte-americano de hipotecas de alto risco, também conhecido como subprime.

Como que em um piscar de olhos, muitos investidores se deram conta de que muitos ativos estavam excessivamente sobrevalorizados e, frente à enxurrada de notícias negativas vindas de toda parte do mundo, resolveram resgatar (ou pelo menos tentar) suas aplicações. Com isso, gerou-se um sério problema de liquidez: muitos desses investidores possuíam em suas carteiras ativos direta ou indiretamente lastreados pelo recebimento de hipotecas e, quando os gestores precisaram vender esses papéis para levantar recursos para fazer frente às solicitações de resgate, quase ninguém queria comprá-los.

Em outras palavras, esses papéis possuíam, como risco de crédito, a capacidade de um cidadão norte-americano comum de manter em dia as prestações de sua hipoteca. Muitos desses cidadãos, por sua vez, estavam eufóricos com a valorização do preço das casas nos Estados Unidos e, ao invés de hipotecar sua casa, faziam isso com outras cinco ou dez, na esperança de poder revendê-las assim que o preço subisse para outro que, provavelmente, pensava da mesma forma.

Por sua vez, companhias hipotecárias parecem ter flexibilizado sobremaneira suas políticas de crédito em prol de desovar a enorme quantidade de dinheiro “parado” na economia – tínhamos (a impressão de) uma situação de elevada liquidez até meados do ano.

Com os modernos artifícios do sistema financeiro, os valores emprestados a esses cidadãos se multiplicaram ao se transformarem em ativos que foram negociados no mercado secundário. Os compradores desses ativos venderam a terceiros, “quartos” e “quintos”, pois aquele título estava “garantido” pelo fluxo do pagamento de hipotecas. Alguns mais ousados usaram esse título para adquirir participação acionária em outras companhias. Os “beneficiados” com esses ativos também se alavancaram e, assim, formou-se um castelo de cartas com uma base extremamente frágil.

Será que ninguém percebeu que uma hora isso não acabaria bem? As modernas ferramentas de controle de risco não acenderam nem uma luz amarela frente a essa situação? Parece que, mais uma vez, a teoria do prospecto de Kahneman e Tversky achou um campo fértil para comprovar o poder das influências no processo decisório.

Observando o mundo através de um quadro (frame), rodeado por uma euforia geral nos mercados globais, muitos investidores riram até de piadas sem graça em meio ao céu de brigadeiro que se via. Às vezes, uma ou outra pequena nuvem aparecia no horizonte, mas a previsão do tempo sempre apontava para dias cada vez mais bonitos.

Agora, após as fortes instabilidades e quedas nos mercados financeiros internacionais, o “cenário”, como muitos dizem, mudou: a economia global provavelmente não crescerá às mesmas robustas taxas anteriormente previstas, o preço das commodities não se sustentará nos patamares tão elevados (face à expectativa de menor demanda) e a ordem do dia é cautela, até que fique claro o impacto na economia real, especialmente na norte-americana.

O estouro de mais uma bolha parece indicar que as influências no processo decisório dos agentes econômicos continuarão a ocorrer – na era do capitalismo moderno, desde 1929 tem sido assim. É verdade que não parece razoável imaginar que os tomadores de decisão não mais se deixarão influenciar por euforias. Contudo, espera-se que tenha ficado ao menos um convite à reflexão quanto ao risco que pode estar associado a momentos de euforia generalizada e de ganhos exorbitantes por seguidos e longos períodos de tempo.

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