segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Caderneta de poupança ou fundos conservadores?

O Brasil vem, através das decisões do Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central, reduzindo gradativamente a taxa básica da economia, a Selic. Nesse sentido, a taxa Selic expressa ao ano caiu de 19,50%, em setembro de 2005, para 11,25%, conforme estipulado pela reunião do Comitê em setembro de 2007.

A redução da taxa de juros é benéfica para a economia como um todo, pois as taxas praticadas para se conseguir crédito na praça também acompanham a trajetória decrescente da Selic. É verdade, contudo, que nem sempre na mesma magnitude: muitas vezes se observam quedas mais discretas das taxas de juros para financiamentos ofertados por instituições financeiras. Mesmo assim, há um ganho para a sociedade como um todo.

Empresas podem tomar recursos pagando menos por isso e, conseqüentemente, ampliar a produção de bens e a prestação de serviços. Naturalmente, a tendência é que a oferta de emprego aumente e a renda do consumidor brasileiro também.

Porém, se para o tomador de recursos a queda da taxa Selic é um bom negócio, o investidor que aplica seus recursos em produtos de investimentos indexados à variação da taxa básica da economia certamente não está muito contente, pelo menos sob essa ótica. Quando a taxa Selic estava em patamares próximos a 20% ao ano, era relativamente fácil obter rendimento líqüido de cerca de 15% ao ano em fundos de investimento conservadores (como Renda Fixa ou DI), já descontandas a taxa de administração e a alíquota de IR.

No entanto, com a taxa de juros a 12,75% ao ano, rendimentos tão expressivos já não são mais comuns para aplicações de baixo risco como essas. Por sua vez, a boa e velha caderneta de poupança, que tem sua rentabilidade corrigida pela TR (Taxa Referencial) acrescida de 6% ao ano, voltou a atrair muitos investidores.

Mas será que vale a pena aplicar na caderneta?

É verdade que aplicações na poupança estão isentas da cobrança de Imposto de Renda e de taxas de administração, diferentemente do ocorrido com fundos de investimento. Por isso, antes de investir em fundos, sempre pesquise nos sites das principais instituições financeiras que atuam no Brasil as alíquotas cobradas, pois quanto maiores forem as taxas de administração, maior será o impacto negativo na rentabilidade do fundo.

Por sua vez, os fundos têm a vantagem de o investidor poder sacar, na grande maioria das vezes, sempre que quiser, sem que isso implique perda de rendimento, algo que não ocorre com a poupança, no caso de resgates feitos fora da data de aniversário.

Outro fato que pode tornar a poupança menos atrativa é uma importante mudança anunciada recentemente. O Conselho Monetário Nacional estipulou que, caso a taxa Selic recue para patamares abaixo de 12% ao ano, o cálculo da TR será revisto, de forma a diminuir o rendimento da poupança.

Com isso, os fundos de investimento conservadores, particularmente os Renda Fixa e DI, tendem a registrar melhores desempenhos, principalmente no longo prazo. Isso porque, de acordo com a tabela de cobrança de Imposto de Renda, a alíquota incidente se reduz conforme o período em que o dinheiro estiver aplicado, chegando a 15% sobre ganho de capital, no caso de aplicações superiores a 2 anos.

Na hora de investir, procure sempre medir os prós e contras de cada aplicação e peça ao gerente de seu banco que faça simulações sobre qual seria o rendimento esperado de cada uma das opções de investimentos dados os valores que você investirá e por quanto tempo pretende deixá-los aplicados.

Finalmente, nunca se esqueça de acompanhar de perto o rendimento de seu portfólio e, caso seja necessário, faça re-alocações.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Aquela dieta que (nunca) se inicia na próxima segunda-feira

O mercado financeiro viveu dias de euforia em 2007. O Ibovespa bateu recordes atrás de recordes de pontuação, o risco-país recuou a patamares mínimos históricos e muitas empresas lançaram, com sucesso, seus papéis na bolsa, operação conhecida como IPO (Initial Public Offer).

Em que se pese o mau humor dos mercados no segundo semestre, precipitado externamente com a crise das hipotecas imobiliárias norte-americanas de alto risco (subprime), e internamente pelos primeiros indícios de aceleração dos índices inflacionários, 2007 cravou o quinto ano consecutivo de ganhos do Ibovespa.

Durante o ano, conforme recordes eram quebrados, alguns investidores passaram a questionar se não estávamos diante de uma bolha prestes a estourar, como o ocorrido com a bolsa de Nova York, em 1929, e com a bolsa eletrônica Nasdaq, já em finais do século XX. Apesar de a discussão ser acalorada e possuir defensores de ambos os lados, certamente esse assunto não esteve presente na maioria dos lares brasileiros.

Conforme a Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE (disponível em www.ibge.gov.br), mais da metade população brasileira manifestou ter alguma dificuldade para chegar ao final do mês com o rendimento auferido no mesmo período, independentemente da classe econômica. Diferentemente daqueles investidores, titubeantes quanto ao futuro do mercado financeiro, esses brasileiros têm como preocupação a chegada do final do mês. Por que será que isso ocorre?

Por um lado, nota-se no Brasil forte concentração de renda e índices de pobreza relativamente altos. Por outro, constata-se que administrar os próprios recursos não é tarefa fácil. Nesse sentido, mesmo alguns que ganham acima da média nacional ainda têm problemas para viver com a renda auferida, como mostra a mesma pesquisa do IBGE: 55% das famílias com rendimento mensal superior a R$ 6 mil afirmaram ter dificuldade para chegar ao final do mês com dinheiro no bolso.

Sendo assim, aprender a lidar com o próprio dinheiro talvez seja uma alternativa interessante e necessária para todos, principalmente para aqueles cujos recursos cessam antes do recebimento do próximo salário. Administrar as finanças pessoais, diferentemente do que se costuma pensar, não envolve necessariamente ser um hábil usuário de planilhas eletrônicas ou se privar de prazeres e desejos de consumo.

Antes de tudo, é importante frisar que qualquer pessoa possui objetivos, desejos de consumo e necessidades básicas, como alimentação, vestuário, saúde. Porém, há um limitador para todos esses pontos: a renda pessoal ou, em outras palavras, o dinheiro que se tem disponível mensalmente. E, quando se tem uma restrição, invariavelmente tem-se um processo de tomada de decisão pela frente.

Assim, administrar bem os próprios recursos está diretamente ligado ao processo de decisão com relação ao consumo. Esse processo, por sua vez, sofre inúmeras influências: psicológicas, individuais, sociais, ambientais, entre outras.

Se você não consegue chegar ao final do mês com dinheiro no bolso, será que não está na hora de uma auto-reflexão quanto ao seu envolvimento com processos de compra e aos aspectos que influenciam sua tomada de decisão?

Outro ponto importante para aprender a lidar com o próprio dinheiro é estabelecer objetivos factíveis e que não impliquem significativas privações no presente; caso contrário gerir seus próprios recursos será como aquela famosa dieta que pretendemos iniciar na próxima segunda-feira. Dieta essa que, dadas tantas influências e tantas privações que são impostas, não resiste ao primeiro pedaço de um bolo de chocolate que nos passa à frente.

O processo de decisão e o planejamento financeiro pessoal

O processo de planejamento financeiro pessoal é o cerne do trabalho do planejador financeiro. Por tamanha importância, essa etapa é rigorosamente abordada pelo Financial Planning Standards Board (FPSB) como forma de prestarmos serviços de consultoria de elevada qualidade a nossos clientes. Contudo, apesar de o processo de planejamento financeiro ser resultado de um trabalho extensivo, que requer capacitação e entendimento das necessidades, das restrições e dos objetivos do cliente por parte do profissional CFPTM, tem-se a impressão de que a parte mais difícil do planejamento financeiro é sua implantação. Mas por que será que isso ocorre?

Administrar os próprios recursos implica uma tomada de decisão intertemporal: consumir hoje e pagar amanhã ou consumir amanhã e pagar hoje. Em outras palavras, deve-se escolher entre antecipar um consumo e pagar, muitas vezes, juros por isso (ainda que representado como custo de oportunidade), ou postergar o consumo e pagar, hoje, quantia menor que a do primeiro caso (ou pagar valor equivalente e consumir mais no futuro).

Apesar de relativamente simples, esse processo de tomada de decisão com resposta binomial é influenciado por uma série de fatores que podem, em linhas gerais, ser aglutinados em quatro grupos: culturais, sociais, pessoais e psicológicos. Se em alguns países do leste asiático predomina a parcimônia com relação aos gastos, representada pelos elevados índices de poupança de países como o Japão, esse traço cultural se expressa de outra maneira dentro da cultura norte-americana, caracterizada por elevados índices de consumo.

Da mesma forma, o consumidor é influenciado por vários aspectos sociais: o grupo de referência de que pretende fazer parte, valores que a família a que pertence cultiva e até mesmo a busca por status impactam o processo de tomada de decisão. Além disso, alguns fatores pessoais também são responsáveis por influências durante o processo decisório. Dentre eles, a idade do consumidor, sua ocupação, sua situação financeira, seu estilo de vida e sua personalidade contribuem para influenciar a tomada de decisão.

O quarto grupo capaz de influenciar o processo de tomada de decisão diz respeito a fatores psicológicos, como crenças, atitudes e motivação para a compra. Da mesma forma, faz também parte desse grupo a percepção da realidade, processo pelo qual indivíduos organizam e interpretam suas impressões sensoriais, com a finalidade de dar sentido a seu ambiente. Assim, o comportamento se baseia não na realidade em si, mas na percepção da realidade.

Essa percepção, por sua vez, também impactará de maneira significativa os processos decisórios, matéria-prima para os estudiosos da chamada Psicologia Econômica, campo de estudo que começou a se destacar principalmente após Amós Tversky e Daniel Kahneman terem sido laureados, em 2002, com o Prêmio Nobel de Economia. Críticos da Teoria da Utilidade, Kahneman e Tversky formularam a Teoria do Prospecto, que parte do princípio que o processo decisório é dependente do referencial (reference-dependent) e que, portanto, não se pode esperar tomada de decisão baseada em aspectos puramente racionais, como prega a Teoria da Utilidade (reference-independent).

Nesse sentido, os pesquisadores apontam para os efeitos do acesso a informações (accessibility) e da forma como essas informações são dispostas ao tomador de decisão (framing) como potenciais influenciadores do processo decisório.

Assim, não se pode desprezar a importância de tantas influências no processo de tomada de decisão durante as fases implantação e acompanhamento do planejamento financeiro. No papel, parecem ser muito claros os benefícios dos juros compostos ao longo do tempo, assim como a postergação do consumo em muitos casos. Contudo, na prática, a situação nem sempre aparece de forma tão clara e simples.

Para lidar com essa situação, o consumidor precisa tomar conhecimento dessas influências e procurar continuamente aprimorar seu processo de tomada de decisão. Para isso, o estabelecimento de metas pode tornar essa tarefa menos árdua, à medida que cada centavo mal gasto contribuirá para postergar a realização dos objetivos. E, nesse contexto, o planejador financeiro pessoal desempenhará um importante papel para fornecer insumos, como forma de viabilizar o alcance de metas e, em última instância, contribuir para manutenção de uma vida financeira saudável de seus clientes.

Em céu de brigadeiro, rimos até de piadas sem graça

Tudo indica que mais uma bolha estourou no mercado financeiro nas últimas semanas. Após seis anos do estouro da bolha das chamadas empresas ponto-com, agora foi a vez de um forte ajuste nos preços dos principais ativos globais decorrente do pânico causado pela crise do mercado norte-americano de hipotecas de alto risco, também conhecido como subprime.

Como que em um piscar de olhos, muitos investidores se deram conta de que muitos ativos estavam excessivamente sobrevalorizados e, frente à enxurrada de notícias negativas vindas de toda parte do mundo, resolveram resgatar (ou pelo menos tentar) suas aplicações. Com isso, gerou-se um sério problema de liquidez: muitos desses investidores possuíam em suas carteiras ativos direta ou indiretamente lastreados pelo recebimento de hipotecas e, quando os gestores precisaram vender esses papéis para levantar recursos para fazer frente às solicitações de resgate, quase ninguém queria comprá-los.

Em outras palavras, esses papéis possuíam, como risco de crédito, a capacidade de um cidadão norte-americano comum de manter em dia as prestações de sua hipoteca. Muitos desses cidadãos, por sua vez, estavam eufóricos com a valorização do preço das casas nos Estados Unidos e, ao invés de hipotecar sua casa, faziam isso com outras cinco ou dez, na esperança de poder revendê-las assim que o preço subisse para outro que, provavelmente, pensava da mesma forma.

Por sua vez, companhias hipotecárias parecem ter flexibilizado sobremaneira suas políticas de crédito em prol de desovar a enorme quantidade de dinheiro “parado” na economia – tínhamos (a impressão de) uma situação de elevada liquidez até meados do ano.

Com os modernos artifícios do sistema financeiro, os valores emprestados a esses cidadãos se multiplicaram ao se transformarem em ativos que foram negociados no mercado secundário. Os compradores desses ativos venderam a terceiros, “quartos” e “quintos”, pois aquele título estava “garantido” pelo fluxo do pagamento de hipotecas. Alguns mais ousados usaram esse título para adquirir participação acionária em outras companhias. Os “beneficiados” com esses ativos também se alavancaram e, assim, formou-se um castelo de cartas com uma base extremamente frágil.

Será que ninguém percebeu que uma hora isso não acabaria bem? As modernas ferramentas de controle de risco não acenderam nem uma luz amarela frente a essa situação? Parece que, mais uma vez, a teoria do prospecto de Kahneman e Tversky achou um campo fértil para comprovar o poder das influências no processo decisório.

Observando o mundo através de um quadro (frame), rodeado por uma euforia geral nos mercados globais, muitos investidores riram até de piadas sem graça em meio ao céu de brigadeiro que se via. Às vezes, uma ou outra pequena nuvem aparecia no horizonte, mas a previsão do tempo sempre apontava para dias cada vez mais bonitos.

Agora, após as fortes instabilidades e quedas nos mercados financeiros internacionais, o “cenário”, como muitos dizem, mudou: a economia global provavelmente não crescerá às mesmas robustas taxas anteriormente previstas, o preço das commodities não se sustentará nos patamares tão elevados (face à expectativa de menor demanda) e a ordem do dia é cautela, até que fique claro o impacto na economia real, especialmente na norte-americana.

O estouro de mais uma bolha parece indicar que as influências no processo decisório dos agentes econômicos continuarão a ocorrer – na era do capitalismo moderno, desde 1929 tem sido assim. É verdade que não parece razoável imaginar que os tomadores de decisão não mais se deixarão influenciar por euforias. Contudo, espera-se que tenha ficado ao menos um convite à reflexão quanto ao risco que pode estar associado a momentos de euforia generalizada e de ganhos exorbitantes por seguidos e longos períodos de tempo.